sábado, dezembro 19, 2009

NATAL DE QUEM?


Mulheres atarefadas
Tratam do bacalhau,
Do peru, das rabanadas.

-- Não esqueças o colorau,
O azeite e o bolo-rei!

- Está bem, eu sei!

- E as garrafas de vinho?

- Já vão a caminho!
- Oh mãe, estou pr'a ver
Que prendas vou ter.
Que prendas terei?

- Não sei, não sei...

Num qualquer lado,
Esquecido, abandonado,
O Deus-Menino
Murmura baixinho:
- Então e Eu,
Toda a gente Me esqueceu?

Senta-se a família
À volta da mesa.
Não há sinal da cruz,
Nem oração ou reza.
Tilintam copos e talheres.
Crianças, homens e mulheres
Em eufórico ambiente.
Lá fora tão frio,
Cá dentro tão quente!

Algures esquecido,
Ouve-se Jesus dorido:
- Então e Eu,
Toda a gente Me esqueceu?

Rasgam-se embrulhos,
Admiram-se as prendas,
Aumentam os barulhos
Com mais oferendas.
Amontoam-se sacos e papeis
Sem regras nem leis.

E Cristo Menino
A fazer beicinho:
- Então e Eu,
Toda a gente Me esqueceu?

O sono está a chegar.
Tantos restos por mesa e chão!
Cada um vai transportar
Bem-estar no coração.

A noite vai terminar
E o Menino, quase a chorar:
- Então e Eu,
Toda a gente Me esqueceu?
Foi a festa do Meu Natal
E, do princípio ao fim,
Quem se lembrou de Mim?
Não tive tecto nem afecto!

Em tudo, tudo, eu medito
E pergunto no fechar da luz:
- Foi este o Natal de Jesus?!!!

(João Coelho dos Santos
in Lágrima do Mar - 1996)

O meu mais belo poema de Natal


segunda-feira, dezembro 07, 2009

NUVENS DA TARDE

São Miguel - Açores



Aquelas nuvens, que voam,
Ninguém pode pôr-lhes mão...
São como as horas que soam,
E as aves, que em bando vão...
Como a folha desprendida,
E como os sonhos da vida,
Aquelas nuvens que voam...

Às vezes o sol, que as doura,
Parece à glória levá-las
Mas surge o vento e, numa hora,
Já ninguém pode avistá-las!
É um convite enganoso,
Um escárnio luminoso,
Às vezes, o sol que as doura!

Tantos castelos caídos!
Tantas visôes dissipadas!
Gigantes, heróis perdidos,
Que mal sustêm as espadas!
Faz pena ver, lá do monte,
Nas ruínas do horizonte,
Tantos castelos caídos!

E as donzelas lastimosas,
Que vão fugindo transidas!
Quem fogem elas ansiosas?
Que buscam elas perdidas?
Ó romances fugidios!
Vejo os tiranos sombrios,
E as donzelas lastimosas!

Aquelas nuvens que vemos,
Esses poemas aéreos,
São os sonhos que nós temos,
Nossos intímos mistérios!
São espelhos flutuantes
Das nossas dores constantes
Aquelas nuvens que vemos...

Nossa alma vai-se com elas,
À procura, quem o sabe?
Doutras esferas mais belas,
Já que no mundo não cabe...
Voando, sem dar um grito,
Através desse infinito,
Nossa alma vai-se com elas!





Antero de Quental
Primaveras Românticas

segunda-feira, outubro 26, 2009

POESIA




“É esta a hora perfeita em que se cala
O confuso murmurar das gentes
E dentro de nós finalmente fala
A voz grave dos sonhos indolentes.
É esta a hora em que as rosas são as rosas
Que floriram nos jardins persas
Onde Saadi e Hafiz as viram e as amaram.
É esta a hora das vozes misteriosas
Que os meus desejos preferiram e chamaram.
É esta a hora das longas conversas
Das folhas com as folhas unicamente.
É esta a hora em que o tempo é abolido
E nem sequer conheço a minha face.”


Sophia de M. B.

quinta-feira, outubro 22, 2009

SER POETA

Ser poeta é ser mais alto, é ser maior
Do que os homens! Morder como quem beija!
É ser mendigo e dar como quem seja
Rei do Reino de Áquem e de Além Dor!
É ter de mil desejos o esplendor
E não saber sequer que se deseja!
É ter cá dentro um astro que flameja,
É ter garras e asas de condor!
É ter fome, é ter sede de Infinito!
Por elmo, as manhãs de oiro e de cetim...
É condensar o mundo num só grito!
E é amar-te, assim, perdidamente...
É seres alma, e sangue, e vida em mim
E dizê-lo cantando a toda a gente!



Florbela Espanca

sexta-feira, outubro 09, 2009

SETE LETRAS


Esta palavra saudade
Sete letras de ternura
sete letras de ansiedade
e outras tantas de aventura.

Esta palavra saudade
a mais bela e a mais pura
sete letras de verdade
e outras tantas de loucura.

Sete pedras, sete cardos,
sete facas e punhais
sete beijos que são nardos
sete pecados mortais.

Esta palavra saudade
sabe a sumo de limão
tem o travo de amargura
que nasceu do coração.

Ai! palavra amarga e doce
estrngulada na garganta
palavra como se fosse
o silêncio que se canta.

Meu cavalo imenso e louco
a galopar na distância
entre o muito e entre o pouco
que me afasta da infância.

Esta palavra saudade
é a mais prenha de pranto
como um filho que nascesse
por termos sofrido tanto.

Por termos sofrido tanto
é que a saudade está viva
são sete letras de encanto
sete letras por enquanto
enquanto a gente for viva.

Esta palavra saudade
sabe ao gosto das amoras
cada vez que tu não vens
cada vez que tu demoras.

Ai! palavra amarga e doce
debruçada na idade
palavra como se fosse
um resto de mocidade

Marcada por sete letras
a ferro e fogo no tempo
Ai! palavra dos poetas
que a disparam contra o vento.

Esta palavra saudade
dói no corpo devagar
quando a gente se levanta
fica na cama a chorar.

Por termos sofrido tanto
é que a saudade está viva
são sete letras de encanto
sete letras por enquanto
enquanto a gente for viva.

Sete Letras, uma das mais belas canções de José Carlos Ary dos Santos que tão bem soube definir saudade. Só Ary dos Santos soube dizê-la, só Simone de Oliveira soube cantá-la!

terça-feira, setembro 29, 2009

POESIA

"Estou cansado , é claro ,
Porque , a certa altura , a gente tem que estar cansada .
De que estou cansado não sei .
De nada serviria sabe-lo
Pois o cansaço ficaria na mesma ,
A ferida dói como dói
E não em função da causa que a produziu .
Sim , estou cansado ,
E um pouco sorridente
De o cansaço ser só isto-
Uma vontade de sono no corpo,
Um desejo de não pensar na alma ,
E por cima de tudo uma tranquilidade lúcida
Do entendimento retrospectivo.....
E a luxuria muda de não ter esperanças ?
Sou inteligente : eis tudo .
Tenho visto muito e entendido muito o que tenho visto ,
E há um certo prazer até no cansaço que isto nos dá ,
Que afinal a cabeça sempre serve para qualquer coisa . "



Álvaro de Campos

quinta-feira, setembro 24, 2009

LUA ADVERSA


Tenho fases, como a lua

Fases de andar escondida,

fases de vir para a rua...

Perdição da minha vida!

Perdição da vida minha!

Tenho fases de ser tua,

tenho outras de ser sozinha


Fases que vão e que vêm,

no secreto calendário

que um astrólogo arbitrário

inventou para meu uso.


E roda a melancolia

seu interminável fuso!

Não me encontro com ninguém

(tenho fases, como a lua...)

No dia de alguém ser meu

não é dia de eu ser sua...

E, quando chega esse dia,

o outro desapareceu...

Cecíla Meireles

domingo, setembro 13, 2009

A FELICIDADE





FELICIDADE É COMO UMA PLUMA

QUE O VENTO VAI LEVANDO PELO AR

VOA TÃO LEVE

MAS TEM A VIDA BREVE

PRECISA QUE HAJA VENTO SEM PARAR



A FELICIDADE DO POBRE PARECE

A GRANDE ILUSÃO DE CARNAVAL

A GENTE TRABALHA O ANO INTEIRO

POR UM MOMENTO DE SONHO

PARA FAZER A FANTASIA

DE REI OU DE PIRATA OU JARDINEIRA

PRA TUDO SE ACABAR NA QUARTA FEIRA



A FELICIDADE É COMO UMA GOTA DE ORVALHO

NUMA PÉTALA DE FLOR

BRILHA TRANQUILA

DEPOIS DE LEVE OSCILA

E CAI COMO UMA LÁGRIMA DE AMOR



A FELICIDADE É UMA COISA LOUCA

MAS TÃO DELICADA TAMBÉM

TEM FLORES E AMORES

DE TODAS AS CORES

TEM NINHOS DE PASSARINHOS

TUDO ISSO ELA TEM

E É POR ELA SER ASSIM TÃO DELICADA

QUE EU TRATO SEMPRE DELA MUITO BEM



TRISTEZA NÃO TEM FIM

FELICIDADE SIM




DE VINICIUS DE MORAIS



*Imagem Google*

terça-feira, setembro 08, 2009

SER MULHER


Ser mulher...
É viver mil vezes em apenas uma vida.
a lutar por causas perdidas e sempre sair vencedora.
A estar antes do ontem e depois do amanhã.
A desconhecer a palavra recompensa apesar dos seus atos.
Ser mulher...
É caminhar na dúvida cheia de certezas.
A correr atrás das nuvens num dia de sol.
A alcançar o sol num dia de chuva.
Ser mulher...
É chorar de alegria e muitas vezes sorrir com tristeza.
É acreditar quando ninguém mais acredita.
É cancelar sonhos em prol de terceiro.
É esperar quando ninguém mais espera.
Ser mulher...
É identificar um sorriso triste e uma lágrima falsa.
É ser enganada, e sempre dar mais uma chance.
É caír no fundo do poço, e emergir sem ajuda.
Ser mulher...
É estar em mil lugares de uma só vez.
É fazer mil papéis ao mesmo tempo.
É ser forte e fingir que é frágil... Pra ter um carinho.
Ser mulher...
É se perder em palavras e depois perceber que se encontrou nelas.
É distribuír emoções que nem sempre são captadas.
Ser mulher...
É comprar, emprestar, alugar, vender sentimentos, mas jamais dever.
É construír castelos na areia, ve-los desmoronados pelas águas.
E ainda assim amá-los.
Ser mulher...
É saber dar o perdão...
É tentar recuperar o irrecuperável.
É entender o que ninguém mais conseguiu desvendar.
Ser mulher...
É estender a mão a quem ainda não pediu.
É doar o que ainda não foi solicitado.
Ser mulher...
É não ter vergonha de chorar por amor.
É saber a hora certa do fim.
É esperar sempre por um recomeço.
Ser mulher...
É ter a arrogância de viver apesar dos dissabores,
das desilusões, das traições e das decepções.
Ser mulher...
É ser mãe dos seus filhos... Dos filhos de outros.
É amá-los igualmente.
Ser mulher...
É ter confiança no amanhã e aceita-lo pelo ontem.
É desbravar caminhos difíceis em instantes inoportunos.
E fincar a bandeira da conquista.
Ser mulher...
É entender as fases da lua por ter suas próprias fases.
É ser "nova" quando o coração está à espera do amor.
Ser "crescente" quando o coração está se enchendo de amor.
Ser "cheia" quando ele já está transbordando de tanto amor.
E ser "minguante" quando esse amor vai embora.
Ser mulher...
É hospedar dentro de si o sentimento do perdão.
É voltar no tempo todos os dias e viver por poucos instantes.
Coisas que nunca ficarão esquecidas.
Ser mulher...
É cicatrizar feridas de outros e inúmeras vezes deixar.
As suas próprias feridas sangrando.
Ser mulher...
É ser princesa aos 20... Rainha aos 30...
Imperatriz aos 40 e... "Especial" a vida toda.
Ser mulher...
É conseguir encontrar uma flor no deserto. Água na seca... Labaredas no mar.
Ser mulher...
É chorar calada as dores do mundo e
Em apenas um segundo, já estar sorrindo.
Ser mulher...
É subir degraus e se os tiver que descer não precisar de ajuda.
É tropeçar, caír e voltar a andar.
Ser mulher...
É saber ser super-homem quando o sol nasce.
E virar cinderela quando a noite chega.
Ser mulher...
É ter sido escolhida por Deus para colocar no mundo os homens.
Ser mulher...
É acima de tudo um estado de espírito.É uma dádiva...
É ter dentro de si um tesouro escondido
e ainda assim divido-lo com o mundo!



Silvana Duboc

sexta-feira, setembro 04, 2009

SERENATA




terça-feira, setembro 01, 2009

SONETO À TUA VOLTA


Voltaste, meu amor... enfim voltaste!
Como fez frio aqui sem teu carinho...
A flor de outrora refloresce na haste
que pendia sem vida em meu caminho.

*
Obrigado... Eu vivia tão sozinho...
Que infinita alegria, e que contraste!
— Volta a antiga embriaguez por que voltaste
e é doce o amor, porque é mais velho o vinho!
*
Voltaste... E dou-te logo este poema
simples e humilde repetindo um tema
da alma humana esgotada e envelhecida...
*
Mil poetas outras voltas celebraram, mas, que importa?
— se tantas já voltaram
só tu voltaste para minha vida..









*J. G. de Araújo Jorge *

quarta-feira, agosto 26, 2009

*************



Já escondi um amor com medo de perdê-lo,
Já perdi um amor por escondê-lo...



Já segurei nas mãos de alguém por estar com medo,
Já tive tanto medo, ao ponto de nem sentir minhas mãos.



Já expulsei pessoas que amava de minha vida,
Já me arrependi por isso...

Já passei noites chorando até pegar no sono,
Já fui dormir tão feliz,
Ao ponto de nem conseguir fechar os olhos...



Já acreditei em amores perfeitos,
Já descobri que eles não existem...




Já amei pessoas que me decepcionaram,
Já decepcionei pessoas que me amaram...




Já passei horas na frente do espelho
Tentando descobrir quem sou,



Já tive tanta certeza de mim,
Ao ponto de querer sumir...



Já menti e me arrependi depois,
Já falei a verdade
E também me arrependi...

Já fingi não dar importância a pessoas que amava,
Para mais tarde chorar quieto em meu canto...



Já sorri chorando lágrimas de tristeza,
Já chorei de tanto rir...

Já acreditei em pessoas que não valiam a pena,
Já deixei de acreditar nas que realmente valiam...

Já tive crises de riso quando não podia...
Já senti muita falta de alguém,
Mas nunca lhe disse...

Já gritei quando deveria calar,
Já calei quando deveria gritar...



Muitas vezes deixei de falar o que penso para agradar uns,
Outras vezes falei o que não pensava para magoar outros...

Já fingi ser o que não sou para agradar uns,
Já fingi ser o que não sou para desagradar outros...

Já contei piadas e mais piadas sem graça,
Apenas para ver um amigo mais feliz...

Já inventei histórias de final feliz
Para dar esperança a quem precisava...

Já sonhei demais,
Ao ponto de confundir com a realidade...



Já tive medo do escuro,
Hoje no escuro "me acho..me agacho..fico ali"...

Já caí inúmeras vezes
Achando que não iria me reerguer,

Já me reergui inúmeras vezes
Achando que não cairia mais...



Já liguei para quem não queria
Apenas para não ligar para quem realmente queria...

Já corri atrás de um carro,
Por ele levar alguém que eu amava embora.



Já chamei pela mamãe no meio da noite
Fugindo de um pesadelo,
Mas ela não apareceu
E foi um pesadelo maior ainda...

Já chamei pessoas próximas de "amigo"
E descobri que não eram;

Algumas pessoas nunca precisei chamar de nada
E sempre foram e serão especiais para mim...



Não me dêem fórmulas certas,
Porque eu não espero acertar sempre...

Não me mostre o que esperam de mim,
Porque vou seguir meu coração!...

Não me façam ser o que eu não sou,
Não me convidem a ser igual,

Porque sinceramente sou diferente!...
Não sei amar pela metade,

Não sei viver de mentiras,
Não sei voar com os pés no chão...

Sou sempre eu mesma,
Mas com certeza não serei a mesma para sempre



Clarice Lispector

domingo, agosto 23, 2009

**********


Quando eu nasci,
Ficou tudo como estava.
Nem homens cortaram veias,
Nem o Sol escureceu,
Nem houve
Estrelas a mais...
Somente,
Esquecida das dores,
A minha Mãe sorriu e agradeceu.
Quando eu nasci,
Não houve nada de novo
Senão eu.
As núvens não se espantaram,
Não enlouqueceu ninguém...
P'ra que o dia fosse enorme,
Bastava
Toda a ternura que olhava
Nos olhos de minha Mãe...


- Sebastião da Gama
-

segunda-feira, agosto 10, 2009

SÚPLICA


Agora que o silêncio é um mar sem ondas,
E que nele posso navegar sem rumo,
Não respondas
Às urgentes perguntas
Que te fiz.
Deixa-me ser feliz
Assim,
Já tão longe de ti como de mim.
Perde-se a vida a desejá-la tanto.
Só soubemos sofrer, enquanto
O nosso amor
Durou.
Mas o tempo passou,
Há calmaria...
Não perturbes a paz que me foi dada.
Ouvir de novo a tua voz seria
Matar a sede com água salgada.






Miguel Torga

CANÇÃO AMIGA


Eu preparo uma canção
em que minha mãe se reconheça,
todas as mães se reconheçam,
e que fale como dois olhos.



Caminho por uma rua
que passa em muitos países.
Se não me vêem, eu vejo
e saúdo velhos amigos.


Eu distribuo um segredo
como quem ama ou sorri.
No jeito mais natural
dois carinhos se procuram.


Minha vida, nossas vidas
formam um só diamante.
Aprendi novas palavras
e tornei outras mais belas.


Eu preparo uma canção
que faça acordar os homens
e adormecer as crianças.





Carlos Drummond de Andrade

sábado, julho 25, 2009

SIMPATIA



Simpatia - é o sentimento

Que nasce num só momento,


Sincero, no coração;


São dois olhares acesos


Bem juntos, unidos, presos


Numa mágica atração.


Simpatia - são dois galhos


Banhados de bons orvalhos


Nas mangueiras do jardim;


Bem longe às vezes nascidos,


Mas que se juntam crescidos


E que se abraçam por fim.


São duas almas bem gêmeas


Que riem no mesmo riso,


Que choram nos mesmos ais;


São vozes de dois amantes,


Duas liras semelhantes,


Ou dois poemas iguais.


Simpatia - meu anjinho,


É o canto de passarinho,


É o doce aroma da flor;


São nuvens dum céu d'agosto


É o que m'inspira teu rosto...


- Simpatia - é quase amor!



Casimiro de Abreu

quinta-feira, julho 09, 2009

VIDA


sexta-feira, julho 03, 2009

ORAÇÃO


sexta-feira, junho 26, 2009

FELICIDADE


quarta-feira, junho 10, 2009

LIANOR PELA VERDURA


Descalça vai para a fonte
Descalça vai para a fonte
Lianor pela verdura;
Vai fermosa, e não segura.
Leva na cabeça o pote,
O testo nas mãos de prata,
Cinta de fina escarlata,
Sainho de chamelote;
Traz a vasquinha de cote,
Mais branca que a neve pura.
Vai fermosa e não segura.
Descobre a touca a garganta,
Cabelos de ouro entrançado
Fita de cor de encarnado,
Tão linda que o mundo espanta.
Chove nela graça tanta,
Que dá graça à fermosura.
Vai fermosa e não segura.




Luís de Camões

terça-feira, junho 09, 2009

QUEM DIZ QUE AMOR É FALSO OU ENGANOSO



Quem diz que Amor é falso ou enganoso,
ligeiro, ingrato, vão, desconhecido,
sem falta lhe terá bem merecido
que lhe seja cruel ou rigoroso.
Amor é brando, é doce e é piadoso.
Quem o contrário diz não seja crido;
seja por cego e apaixonado tido,
e aos homens, e inda aos deuses, odioso.
Se males faz Amor, em mi se vêem;
em mi mostrando todo o seu rigor,
ao mundo quis mostrar quanto podia.
Mas todas suas iras são de amor;
todos estes seus males são um bem,
que eu por todo outro bem não trocaria.


Luís Vaz de Camões

RECADO AOS AMIGOS DISTANTES



Meus companheiros amados,
não vos espero nem chamo:
porque vou para outros lados.
Mas é certo que vos amo.
Nem sempre os que estão mais perto
fazem melhor companhia.
Mesmo com sol encoberto,
todos sabem quando é dia.
Pelo vosso campo imenso,
vou cortando meus atalhos.
Por vosso amor é que penso
e me dou tantos trabalhos.
Não condeneis, por enquanto,
minha rebelde maneira.
Para libertar-me tanto,
fico vossa prisioneira.
Por mais que longe pareça,
ides na minha lembrança,
ides na minha cabeça,
valeis a minha Esperança.




Cecília Meireles, in 'Poemas (1951)'

quinta-feira, maio 21, 2009

A MULHER

Ó Mulher! Como és fraca e como és forte!
Como sabes ser doce e desgraçada!
Como sabes fingir quando em teu peito
A tua alma se estorce amargurada!

Quantas morrem saudosa duma imagem.
Adorada que amaram doidamente!
Quantas e quantas almas endoidecem
Enquanto a boca rir alegremente!

Quanta paixão e amor às vezes têm
Sem nunca o confessarem a ninguém
Doce alma de dor e sofrimento!

Paixão que faria a felicidade
Dum rei; amor de sonho e de saudade,
Que se esvai e que foge num lamento!



Florbela Espanca

domingo, maio 10, 2009

HISTÓRIA BREVE DE UMA BONECA DE TRAPOS



Era uma vez uma boneca
Com meio metro de altura...
Insinuante, bonita,
Mas, pobremente vestida.
Um ar triste, __ uma amargura
Diluída no olhar...
_ Grandes olhos de safira,
E um sorriso combalido
Como flor que vai murchar.
Quase a meio da vitrine
Lá daquela capelista
Essa boneca de trapos
A ninguém dava na vista!
Ninguém via o seu sorriso!
Ninguém sequer perguntava:
Quanto vale a «marafona»?
Quanto querem p'la «Princesa»?...
Passaram anos. __ Com eles,
Foi-se a minha mocidade
E cresce a minha tristeza.
_Quem é que dá p'la Boneca
Que os meus olhos descobriram
Lá naquela capelista
Quase à esquina do jardim?...
_ Quem dá por Ela? Ninguém.
E quantas almas assim!




António Botto

sexta-feira, maio 08, 2009

METADE


Que a força do medo que tenho
Não me impeça de ver o que anseio.
Que a morte de tudo em que acredito
Não me tape os ouvidos e a boca
Porque metade de mim é o que eu grito
Mas a outra metade é silêncio.
Que a música que ouço ao longe
Seja linda ainda que tristeza
Que a mulher que eu amo seja pra sempre amada
Mesmo que distante
Porque metade de mim é partida
Mas a outra metade é saudade.
Que as palavras que eu falo
Não sejam ouvidas como prece e nem repetidas com fervor
Apenas respeitadas
Como a única coisa que resta a um homem inundado de sentimentos
Porque metade de mim é o que ouço
Mas a outra metade é o que calo.
Que essa minha vontade de ir embora
Se transforme na calma e na paz que eu mereço
Que essa tensão que me corrói por dentro
Seja um dia recompensada
Porque metade de mim é o que eu penso e a outra metade é um vulcão.
Que o medo da solidão se afaste, que o convívio comigo mesmo se torne ao menos suportável.
Que o espelho reflita em meu rosto um doce sorriso
Que eu me lembro ter dado na infância
Por que metade de mim é a lembrança do que fui
Mas a outra metade eu não sei.
Que não seja preciso mais do que uma simples alegria
Pra me fazer aquietar o espírito
E que o teu silêncio me fale cada vez mais
Porque metade de mim é abrigo
Mas a outra metade é cansaço.
Que a arte nos aponte uma resposta
Mesmo que ela não saiba
E que ninguém a tente complicar
Porque é preciso simplicidade pra fazê-la florescer
Porque metade de mim é a platéia
A outra metade é a canção.
E que a minha loucura seja perdoada
Porque metade de mim é amor
E a outra metade também.


Oswaldo Montenegro

domingo, abril 19, 2009

PÉTALAS DE ROSA


Porque foste na vida
A última esperança
Encontrar-te me fez criança
Porque já eras meu
Sem eu saber querer
Porque és o meu homem
E eu tua mulher.
Porque tu me chegaste
Sem me dizer que vinhas
E as tuas mãos foram minhas com calma
Porque foste em minh'alma
Como um amanhecer
Porque foste o que tinha que ser.


Vinicius de Moraes

domingo, março 22, 2009

AMORE MIO


Amore mio!
Come ti voglio bene.
Dopo che ti ho conosciuto,
il mondo siè modificato.
Il sole splende dentro di me,
la luna ha fatto dimora nel mio cuore
Portando le stelle come ospiti.
Il calore di tuo corpo
scaldò la mia anima.
Io non so quello che faccio
della mia vita
se um giorno rimarró senzate,
perché questo amore
è la ragione della mia esistenza.
Vita mia,
quando mi chiedi
se ti amo,
Rispondo che è vero.
Parlami d'amore, amore mio,
in prosa o in verso
perchè nulla in questo mondo
è piu bello del nostro amore.
Io te amerò
per il resto della mia vita e...
Scusami amore mio
per estare enamorata di te;
per amarti molto ...moltissimo

********

Amor Meu !
Como te quero bem.
Depois que te conheci
O mundo ficou diferente.
O sol brilhou dentro de mim,
a lua fez morada dentro do meu coração
trazendo as estrelas como convidadas.
O calor do teu corpo
aqueceu minh'alma.
Não sei o que faço
da minha vida
se um dia ficar sem ti,
porque este amor
é a razão do meu existir.
Vida minha
quando me perguntas
se te amo,
respondo que é verdade.
Fala de amor pra mim, amor meu,
em prosa ou verso
porque nada neste mundo
é mais belo que nosso amor.
Vou te amar
para o resto desta minha vida e...
Desculpa Amor Meu
por estar apaixonada por ti;
por te amar tanto ...tanto...


Marilene

sexta-feira, março 20, 2009

PRIMAVERA

GLÓRIA

Depois do Inverno, morte figurada,
A primavera, uma assunção de flores.
A vida Renascida
E celebrada
Num festival de pétalas e cores.


Miguel Torga
Recados Animados

domingo, fevereiro 22, 2009

ACALENTO

Eu só queria um ombro para encostar e dizer a
falta que o Ser Humano me faz,
Eu só queria me acomodar em um colo,
e sentir o calor do amor,
assim como o corpo é aquecido
quando exposto ao raio do sol.

Eu só queria não ser tão ausente
no coração de tanta gente...
Eu queria quase nada...
Tão pouco o que eu queria...

Queria compreensão, ternura e um pouco de razão,
Queria um sorriso gostoso despretensioso,
Um abraço doado, apertado, sensibilizado.
Um Te amo de coração...

Queria ganhar um pouquinho de algum chão,
sem poeiras da imaginação.
Queria continuar a acreditar que pessoas
ainda são capazes de se doar.

Eu só queria dentro do mundo com tanta gente ,
Ter o imenso prazer, de pelo menos à alguém dizer:

Por ti vale todo meu viver!
Eu, Simplesmente queria...
Eu só queria...

Cora Maria

sexta-feira, fevereiro 20, 2009

CANÇÃO A CAMINHO DO CÉU



Foram montanhas? foram mares?
foram os números...? - não sei.
Por muitas coisas singulares,
não te encontrei

E te esperava, e te chamava,
e entre os caminhos me perdi.
Foi nuvem negra? maré brava?
E era por ti!


As mãos que trago, as mãos são estas.
Elas sozinhas te dirão
se vem de mortes ou de festas
meu coração.

Tal como sou, não te convido
a ires para onde eu for.

Tudo que tenho é haver sofrido
pelo meu sonho, alto e perdido,
- e o encantamento arrependido
do meu amor.
Cecília Meirelles

segunda-feira, fevereiro 16, 2009

SAUDADE


Saudade é solidão acompanhada,
é quando o amor ainda não foi embora,
mas o amado já...

Saudade é amar um passado que ainda não passou,
é recusar um presente que nos machuca,
é não ver o futuro que nos convida...

Saudade é sentir que existe o que não existe mais...

Saudade é o inferno dos que perderam,
é a dor dos que ficaram para trás,
é o gosto de morte na boca dos que continuam...

Só uma pessoa no mundo deseja sentir saudade:
aquela que nunca amou.

E esse é o maior dos sofrimentos:
não ter por quem sentir saudades,
passar pela vida e não viver.

O maior dos sofrimentos é nunca ter sofrido.


Pablo Neruda

sexta-feira, janeiro 16, 2009

A LINGUAGEM DOS OLHOS


Falta ainda a linguagem do gosto!
Que gosto terá sua boca quando colada na minha?
Que indizível prazer devo sentir ao te percorrer?
Que doce delírio sentir tua boca, todo o meu corpo morder...

Falta ainda a linguagem do tato!
Como será o entrelaçar das nossas trêmulas mãos?
O abraço tão apertado que poderemos ouvir nossos corações,
pulsando sôfregos e descompassados
em meio a tão arrebatadoras emoções...

Falta ainda a linguagem do cheiro!
Não o cheiro da minha ou da tua preferida colônia.
Mas o nosso cheiro, natural, hormonal, quase animal.
alando da premência da entrega,
assim sem nenhuma cerimônia...

Porque eu já conheço a tua voz acariciante.
Porque eu já conheço a tua melancólica expressão.
Porque eu já conheço o teu complicado sentir.
Porque eu já conheço a tua férrea razão.

Mas que presunção a minha, eu achar que te conheço.
Não porque falte o tato, o olfato e o paladar.
Eu só poderei dizer que realmente te conheço
quando, olhos nos olhos, a tua Alma eu puder sondar.



(Fátima Irene Pinto)

quinta-feira, janeiro 01, 2009

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O amor é grande e cabe nesta janela sobre o mar. O mar é grande e cabe na cama e no colchão de amar. O amor é grande e cabe no breve espaço de beijar.

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