quinta-feira, novembro 29, 2007

TEU RISO

Leonardo da Vinci


Tira-me o pão, se quiseres,
tira-me o ar,
mas não
me tires o teu riso.
Não me tires a rosa,
a lança que desfolhas,
a água que de súbito
brota da tua alegria,
a repentina onda
de prata que em ti nasce.
A minha luta é dura e regresso
com os olhos cansados
às vezes por ver
que a terra não muda,
mas ao entrar teu riso
sobe ao céu a procurar-me
e abre-me todas
as portas da vida.
Meu amor, nos momentos
mais escuros solta
o teu riso e se de súbito
vires que o meu sangue mancha
as pedras da rua,
ri, porque o teu risos
será para as minhas mãos
como uma espada fresca.
À beira do mar, no outono,
teu riso deve erguer
sua cascata de espuma,
e na primavera, amor,
quero teu riso como
a flor que esperava,
a flor azul,
a rosada minha pátria sonora.
Ri-te da noite,
do dia, da lua,
ri-te das ruas
tortas da ilha,
ri-te deste grosseiro
rapaz que te ama,
mas quando abro
os olhos e os fecho,
quando meus passos vão,
quando voltam meus passos,
nega-me o pão, o ar,
a luz, a primavera,
mas nunca o teu riso,
porque então morreria.



Pablo Neruda

quarta-feira, novembro 21, 2007

MARIA DA CONCEIÇÃO

Maria da Conceição
Vi-te ontem na procissão
E duvidei do que via...
Pois quando por ti passei
Olhei em volta e reparei
que toda a gente se ria... de ti!
Sim de ti cachopa.
Seja embora a tua boca
Vermelha como a romã
Embora a face trigueira
Tenha um rosado à maneira
De saborosa maçã
Embora o corpo delgado
Lembre um lírio delicado
E tenhas um lindo olhar
Eu juro que foi de ti
Que todos riram e eu ri
Quando te vimos passar.
Maria da conceição
Ou tu perdeste a razão
Ou então foi bruxaria.
Um chapéu nessa cabeça
Mas tu queres que eu endoideça
Oh minha pobre Maria da Conceição
Mas que horror!...E dize cá por favor.
Quem te vestiu esse fato
Que o corpo te escangalhou
E as ancas te deformou
Dando-te um vago ar de pato marreco?
Ai não Maria
Decerto ninguém diria
Vendo-te na procissão
Que tu és certa pequena
De linda cara morena
Maria da Conceião
Teu corpo só bem se ajeita
À longa saia bem feita
Que às formas te dá esbelteza
E na cabeça formosa
Em vez dum chapéu com rosa
põe chita bem portuguesa
Desce dos saltos donzela
E calça a tua chinela
Que tanto te alinda o pé
A gente deve na vida
Não andar nunca iludida
E ser apenas quem é
Maria da Conceição
Sai-me já da procissão
Pois até nosso senhor
Se te vê dessa maneira
Sendo embora de madeira
Pode fugir do andor
Calça a chinelinha,calça
Põe o lenço de Alcobaça
E a saia de flanela
Teu lindo chaile de tricana
Que tu és ribatejana
Que tu Maria és aquela
Nascida nesta paisagem
Criada com esta aragem
Que torna a mulher formosa
E em paisagem bravia
Nunca pode ir bem Maria
Esse chapéu, essa rosa
Volta depois sem vaidade
Eu amo a simplicidade
Gosto de ti sem mentira
Sem poses sem presunção
Maria da Conceição
De Vila Franca de Xira.


Alice Ogando

segunda-feira, novembro 19, 2007

O ÚNICO DEFEITO DAS MULHERES...


Quando Deus fez a mulher, já estava a trabalhar há seis dias consecutivos.

Apareceu um anjo que lhe perguntou: "Deus, porque estás a perder tanto tempo com esta criação?"

Ao que Deus respondeu: "Já viste a minha lista de especificações para este projecto? Ela tem que ser completamente lavável, mas sem ser de plástico, tem mais de 200 partes móveis, todas substituíveis, e é capaz de sobreviver à base de coca-cola light e restos de comida, tem um colo capaz de segurar em quatro crianças ao mesmo tempo, tem um beijo capaz de curar qualquer coisa desde um arranhão no joelho a um coração ferido e faz isto tudo apenas com duas mãos."

O anjo ficou estupefacto com estas especificações. "Só duas mãos!?
Impossível! E esse é apenas o modelo normal? É muito trabalho só para um dia. É melhor acabares só amanhã."

"Nem pensar", protestou Deus. "Estou quase a acabar esta criação que me é tão querida. Ela já é capaz de se curar a si própria quando fica doente. E consegue trabalhar 18 horas por dia."

O anjo aproximou-se e tocou na mulher. "Mas fizeste-a tão macia e delicada, meu Deus".

"Sim, mas também pode ser muito resistente. Nem fazes ideia o que ela pode fazer e aguentar."

"E ela vai ser capaz de pensar?" perguntou o anjo. "Não só é capaz de pensar como é capaz de negociar e convencer"

O anjo então reparou num pormenor e tocou na cara da mulher.

"Ups, parece que tens uma fuga neste modelo. Eu disse-te que estavas a tentar fazer demais numa criatura só."

"Isso não é uma fuga, é uma lágrima." "E para que é que isso serve?" perguntou o anjo. "A lágrima é o seu modo de exprimir alegria, pena, dor, desilusão, amor, solidão, luto e orgulho."

O anjo estava impressionado."És um génio, Deus. Pensaste em tudo."

E de facto as mulheres são verdadeiramente espantosas. Têm capacidades que surpreendem os homens. Carregam fardos e dificuldades, mas mantendo um clima de felicidade, amor e alegria. Sorriem quando querem gritar.
Cantam quando querem chorar. Choram quando estão felizes e riem quando estão nervosas.
Lutam por aquilo em que acreditam e não aguentam injustiças. Não aceitam um "não" quando acreditam que existe uma solução melhor.

Prescindem de tudo para dar à família. Vão com um amigo assustado ao médico. Amam incondicionalmente. Choram quando os seus filhos são os melhores e aplaudem quando um amigo ganha um prémio. Ficam radiantes quando nasce um bébé ou quando alguém se casa. Ficam devastadas com a morte de alguém querido, mas mantêm a força além de todos os limites.

Sabem que um abraço e um beijo podem curar qualquer desgosto. Existem mulheres de todos os formatos, tamanhos e cores. Elas conduzem, voam, andam e correm ou mandam e-mails só para mostrar que se preocupam contigo. O coração de uma mulher mantem este mundo a andar. Elas trazem alegria, esperança e amor. Dão apoio moral à sua família e amigos.

As mulheres tem coisas vitais a dizer e tudo para dar.



NO ENTANTO, SE EXISTE UM DEFEITO NAS MULHERES É QUE ELAS SE ESQUECEM CONSTANTEMENTE DO SEU VALOR.


(Anónimo)

domingo, novembro 04, 2007

ESCADA SEM CORRIMÃO


É uma escada em caracol
E que não tem corrimão.
Vai a caminho do sol
Mas nunca passa do chão.

Os degraus, quanto mais altos,
Mais estragados estão,
Nem sustos nem sobressaltos
Servem sequer de lição.

Quem tem medo não a sobe
Quem tem sonhos também não.
Há quem chegue a deitar fora
O lastro do coração.

Sobe-se numa corrida,
Corre-se p'rigos em vão.
Adivinhaste: é a vida
A escada sem corrimão.


David Mourão Ferreira